Igreja Evangélica Brasileira no Novo Século


O presente artigo fora publicado no Jornal ALELUIA de dezembro de 2009. Também é um trabalho feito para o curso de bacharel em teologia que fiz no SETEB . 


Igreja Evangélica Brasileira no Novo Século

O que tem distanciado a Igreja do pensamento da Reforma em que havia uma verdadeira confissão de fé? 

As cinco maneiras pelas quais o mundo tem ditado suas normas de conduta à humanidade em oposição aos cinco pilares do Evangelho da Graça apresentados por meio dos pilares da Reforma Protestante do século XVI. 


Igreja Evangélica Brasileira no Novo Século. 


A Igreja evangélica brasileira (talvez o evangelicalismo mundial) está vivendo dias de comodismo tal que arrefece os ânimos de muitos líderes. Por outro lado temos estatísticas bem elaboradas dizendo que o número de evangélicos tem crescido de forma a deixar contentes outro tanto de líderes. 

Mas, de concreto o que está mesmo acontecendo? Quais valores o evangelho tem inserido na sociedade pós-moderna? Qual teologia tem vivido os evangélicos do século XXI? Quem tem influenciado quem? O que pensa o mundo acerca de Cristo a verdade que liberta? Os evangélicos sabem no que tem crido? Pregam a verdade objetiva ou subjetiva? 

Responder estas perguntas é um desafio. Foi um desafio para os reformadores do século XVI tirar os evangélicos do comodismo (comodismo por coação, talvez) em que viviam. Os tempos mudaram, mas não parece. Parece ocorrer exatamente o que descreve Salomão em Eclesiastes 1. 10 e 11. 

O evangelista Mateus registra no capítulo 24 verso 12 (NVI): “Devido ao aumento da maldade, o amor de muitos esfriará,...” Já a RA traz em sua 2ª edição: “E, por se multiplicar a iniquidade, o amor se esfriará de quase todos.” É certo que a partir das Escrituras (sempre a partir dela pelo fato de que ela é autoridade máxima – sola Scriptura) encontraremos as respostas para tais questionamentos. 

A iniquidade é, portanto a causa mais acertada para a existência de tal esfriamento nos valores cristãos que tem solapado a fé da cristandade. Às vezes o homem da era pós-moderna tem se perguntado se vale a pena persistir nesta trajetória. Não que haja mudança na essência do evangelho, mas tem havido sim, na elaboração de uma teologia que seja fundamentada em argumentos exclusivamente escriturísticos, ou seja, na Palavra de Deus e não no antropocentrismo como tem sido. 

O Dr. James Montgomery Boice apresenta em seu livro intitulado “O Evangelho da Graça, 2003”, na parte um – Nossa Cultura Decadente – capítulos I e II argumentos bem fundamentados retratando a Igreja Evangélica Americana, que, diga-se, não tem sido de louvores e honrarias às ações de seus líderes quanto a promulgação de sua confissão de fé. 

Levando-se em conta que a Teologia Brasileira ainda engatinha e que grande parte de seus ensaios teológicos tem sido embasados na Teologia Americana a descrição do livro quanto à Cultura Evangélica Americana aplica-se perfeitamente a nós, Igreja Evangélica Brasileira. 
O Dr. Boice cita (pág. 19, 2º parágrafo) David F. Wells, No Place for Truth, quando este afirma que “a Igreja evangélica como força religiosa significante está morta ou moribunda, porque tem esquecido o propósito de sua existência.” Continua ele: “Em vez de tentar fazer o trabalho de Deus do jeito dEle, ela está tentando construir um reino terreno próspero com ferramentas seculares”. Wells ainda declara: “...apesar de nosso aparente sucesso, temos “vivido em um paraíso de tolos”. 

Quem tem influenciado quem? Esta pergunta é tão pertinente ao tema proposto que ela pode despertar as mentes dirigentes para uma tomada de posição urgente. Paulo, o apóstolo roga (na verdade ele implora) que não nos conformemos com este mundo, mas que transformemos pela renovação de nosso entendimento. A NTLH traz o texto assim: “Não vivam como vivem as pessoas deste mundo, mas deixem que Deus os transforme por meio de uma completa mudança da mente de vocês.” 

Pensemos em cinco modelos do mundo que tem dirigido a sociedade a caminhos distantes de Deus e como eles se relacionam diretamente com a fé evangélica. Também será possível concluir que de acordo com II Crônicas 7.14 e Lamentações 3.29, podemos pôr a boca no pó e haveremos de encontrar esperança. 
Ei-los: 


1) SECULARISMO [/u]– fomos ensinados desde tenra idade (quer seja física ou eclesial) que o mundanismo é não fumar, não jogar, não beber, etc., porém, é só isso mesmo que é mundanismo? Este termo descreve a estrutura mental de valores da humanidade em nossa época. Mundanismo e secularismo vistos da ótica da Teologia se entrelaçam. 

Por mundanismo o dicionário Michaelis diz que é 1. Vida mundana. 2. Hábito ou sistema dos que só procuram prazeres materiais. Já secular: 4. Diz-se do clero, ..., que não pertence à ordem ou congregação religiosa. 5. Que vive no século ou que não faz votos monásticos. 

Como vivemos num mundo secularizado onde o sagrado deixou de ser mencionado a tal ponto que muitos desconhecem o termo ‘sacro’ que se refere àquilo que é dedicado a Deus (ou sagrado). Como escaparemos nós (a Igreja evangélica) se negligenciarmos tal grande responsabilidade de ser o sal da terra e a luz do mundo? 


2) HUMANISMO - Aqui o antropocentrismo reina absoluto. O homem olha para seu próximo não como sendo criado à imagem de Deus mas sim como o centro do universo. No humanismo o homem sente todo orgulho de achar que é o centro de tudo. 

É a “doutrina que coloca o homem no centro do universo e das preocupações filosóficas” assim define o dicionário o verbete humanismo. Definição clara. As preocupações filosóficas cristãs têm se mostrado também coadunadas com esta definição. 

As liturgias dos cultos têm sido mudadas para o show gospel onde todos os holofotes têm sido destinados ao homem. O Cristo do qual fala Hebreus 11.2 – autor e consumador da fé - tem sido vilipendiado e relegado ao ostracismo. 

Vale aqui lembrar que o orgulho foi o pecado de lúcifer quando ainda tinha a proeminência no céu. O orgulho continua sendo o pecado que mais derruba o ser humano, seja ele evangélico ou não. É provável que exista a mão do diabo nesta trilha (o orgulho) que o homem do século XXI tem seguido, pois, afinal, assim o tombo é certeiro. 


3) RELATIVISMO – A formação secular tem criado estudantes que só creem no relativismo desprezando assim o absoluto. Allan Bloom, citado pelo Dr. Boice, escrevendo em seu livro The Closing of the American Mind diz: “Há uma coisa da qual um professor pode estar absolutamente certo: quase todo estudante entrando na universidade acredita, ou diz que acredita que a verdade é relativa.” 

Cabe-nos concordar com o que a revista Time, referindo-se à América, chamou de “um pântano moral” e “um vácuo de valores”. E não só concordar, mas aplicar o mesmo termo para definir também o evangelicalismo brasileiro. 

Chega-se ao consenso então que relativismo é este pântano moral que desqualifica o ser humano quando o reduz a um ser desprezível e sem esperança, já que, ele se encontra vazio num vácuo de valores. Só a verdade absoluta pode dar esperança ao homem. 


4) MATERIALISMO – O materialismo está intimamente ligado ao secularismo já que é parte do que o secularismo é. Se há qualquer valor na vida este deve ser encontrado na parte material, preceitua o materialismo sem escrúpulos. 

Aqui encontramos mergulhada a Igreja evangélica com todo o seu empenho e ardor evangelístico. Uma aplicação prática de Apocalipse 3.14-22 – a Igreja de Laodicéia em cada um de seus aspectos. A teologia da prosperidade encontra farto espaço no seio da Igreja brasileira, uma vez que, perdurando a diferença das classes sociais e havendo um desejo de subir na escala social os sonhadores da riqueza sem trabalho são acalentados por tal ensino. 

E nota-se que há um descuido na aplicação da Palavra de Deus quando seus líderes não levam em conta onde nasceu este espírito materialista, qual o contexto neste nascedouro; A realidade em que viviam os criadores desta filosofia bem como a cultura onde nos encontramos e a cultura de onde vieram tais preceitos. Falta uma interpretação coerente aqui. 

O materialismo não deve ser encarado somente como bens de consumo mas também valores bem mais relevantes como o gosto por um artista musical, time de futebol, grifes,e , principalmente o prazer carnal. A doutrina do ter sucesso, dinheiro é mais proeminente do que ser uma pessoa de comprometimento com valores morais e sobretudo espirituais. 


5) PRAGMATISMO – No pragmatismo encontra-se a filosofia que mede a verdade por seu valor utilitário. Estes pensamentos filosóficos têm sua origem no século XIX. Nomes como John Stuart (1806-1873), John Dewey (1859-1952) e Willian James (1942-1910) influenciaram muito o pensamento da época e que tem chegado até nós. 

Formalidade da boa sociedade, etiqueta é o que significa o pragmatismo. Neste pensamento é que cabe a afirmativa: se isto funciona para mim, é assim que deve ser. Note que todos os cinco pensamentos do mundo estão entrelaçados. 

A alegação do “funciona para mim” parece justificar quase toda crença no sistema da Igreja evangélica brasileira. Estratégias de evangelismo, de construção de suntuosos templos tudo é justificado por esta ordem de pensamento. E assim são massacrados pensamentos discordantes deste pragmatismo. Aqueles que não conseguem agir neste tipo de pensamento são rechaçados. 
Adeptos deste cristianismo pragmático chegam ao absurdo de oferecerem curas, felicidade e prosperidade desde que seus seguidores sigam certo padrão de técnicas corretas. E sempre encontram incautos dispostos a uma mandinga para se darem bem, afinal, são ensinados pragmaticamente assim. 


CONCLUSÃO. 

O que está acontecendo? Quais valores o evangelho tem inserido na sociedade pós-moderna? Qual Teologia tem vivido os evangélicos do século XXI? Quem tem influenciado quem? O que pensa o mundo acerca de Cristo a verdade que liberta? Os evangélicos sabem no que tem crido? Pregam a verdade objetiva ou subjetiva? Refaço aqui as perguntas com as quais iniciei o texto. 

Providencialmente na Teologia Reformada temos cinco pilares que satisfazem aos anseios destas perguntas. Exatamente cinco pilares que se opõem aos cinco modelos de pensamento que tem guiado este mundo que jaz no maligno. Note que há poder na crença da Escritura Sagrada por meio desta confissão de fé na Doutrina da Graça que expomos a partir de agora. 

A Igreja Evangélica que é herdeira dos princípios da Reforma também deve pautar sua confissão de fé nos princípios desta herança reformada. Isto é o que vence o mundo, segundo João, a nossa fé. (I João 5.4). 


1) Contra o Secularismo existe o pilar: sola Scriptura. Enquanto o secularismo se firma no hábito ou sistema dos que só procuram prazeres materiais no pilar da reforma encontra-se somente a escritura. Ela é inerrantemente a fonte de toda autoridade e que fornece prazeres espirituais, ou a vontade de Deus para a humanidade. 

Em Calvino temos um bom exemplo de como a Escritura tinha o seu lugar de honra. Do começo ao fim de seu ministério, Calvino manteve sua pregação singularmente focalizada na explicação do significado planejado por Deus para o texto bíblico. Contrário às livres interpretações que fazem os pregadores da atualidade dando seu ponto de vista ao texto e despojando-o da sua verdade axiomática. 


2) Contra o humanismo solus Christus. No humanismo encontra-se o homem sentado no trono principal ao passo que em solus Christus encontramos Cristo, somente Cristo reinando absoluto no trono. Somente Cristo tem o domínio pelos séculos dos séculos! 

Vivemos um tempo que o homem tem sido tudo o que importa. No mundo secular é assim. No mundo evangélico tem sido de igual maneira, ainda que subjetivamente. Mateus 6.33 delineia em que devemos pautar nossas vidas e qual Rei deve ser entronizado em nossas vidas. 

3) Contra o relativismo sola Fide. Os reformadores sempre expressaram que a justificação é pela graça mediante a fé somente pelos méritos exclusivamente de Cristo Jesus. Sendo os méritos devidos exclusivamente a Cristo então se baseia na justiça de Cristo e não em nossa própria justiça, que, como bem disse o profeta Isaías “são trapos de imundícia”. 

Enquanto no relativismo nada há que seja absoluto em sola Fide nos deparamos, por meio da fé, com Cristo (solus Christus) a verdade absoluta. Confirma-se o enunciado por meio de João 14.6 – eu sou a verdade; E também João 8.32 e 36: E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará. E, Se, pois, o Filho vos libertar, verdadeiramente sereis livres! 

4) Opondo-se ao materialismo encontramos sola Gratia. Todos dependemos de coisas materiais, entretanto isso não deve guiar nossas vidas. Não há promessa de terra aqui senão a Canaã que desce do céu – a promessa aos crentes é espiritual. É sempre a Graça como dita a Paulo: a minha Graça te basta. Paulo não teve a resposta a suas orações como desejava e nem como os pregadores da atualidade dizem que deve ser: à base da reivindicação. 

Esbaldar-se na Graça é melhor que alimentar falsas esperanças baseadas na falácia de bons oradores, verdadeiros artistas do púlpito que tem se aproveitado da escassez de bens materiais e assim alimentado sonhos. Não é que vivemos a geração de sonhadores? Isso alerta para o excesso de sono. 

Porque pela Graça (sola Gratia) sois salvos, mediante a fé (sola Fide); e isto não vem de vós; é dom de Deus (solus Christus); não de obras (não é fruto de materialismo) , para que ninguém se glorie (não de si mesmo mas à sola Gratia). Efésios 2.8,9. 

5) E finalmente contra o pragmatismo soli Deo gloria. Esta é a verdade objetiva e absoluta que bem descreve “o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê”! É prático pensar que o homem pode cooperar com Deus na sua salvação. Mas como devemos dar glória somente a Deus a salvação pertence unicamente ao nosso Deus. 

Funciona bem ao orgulho humano pensar que ele pode ser o co-autor de sua salvação. O Espírito Santo de Deus por meio do apóstolo Paulo descaracteriza tal pensamento quando escreve: pela Graça sois salvos... Para que ninguém se glorie. Efésios 2.8,9. As Escrituras são fartas neste ensinamento de que a salvação eterna é obra totalmente pertencente a Deus – uma das razões pelas quais ele declara que sua glória não daria a outrem, Isaías 42.8; 48.11. 

Urge à Igreja Evangélica Brasileira que reveja como tem confessado sua fé. 

Soli Deo gloria! 




BIBLIOGRAFIA 

Dicionário Michaelis – versão eletrônica. 
Bíblia Sagrada – NVI. 
Bíblia Sagrada – NTLH. 
O Evangelho da Graça, 2003 – A aventura de restaurar a vitalidade da Igreja com as doutrinas bíblica que abalaram o mundo. James Montgomery Boice. Editora Cultura Cristã. Tradução Meire Portes Santos. São Paulo, SP. 
A Arte Expositiva de João Calvino, 2009 – Steven Lawson. Editora Fiel, São José dos Campos, SP.

  • 30 Dezembro 2009

Comentários

  1. Pensando no texto acima, creio que se realmente a igreja tivesse a noção da doutrina da graça e da eleição ela estaria trilhando um caminho melhor do que está hoje. Vemos que o que importa é a quantidade de membros de uma determinada igreja, o crescimento numérico, e quando estamos numa igreja tradicional e os nossos líderes se preocupam com esses números fugimos da realidade da Bíblia. Creio que aqueles que estão hoje na igreja são os eleitos, esses são ganhos através da ação do Espírito Santo "37 Então, disse aos seus discípulos: A seara é realmente grande, mas poucos os ceifeiros. 38 Rogai, pois, ao "Senhor da seara", que mande ceifeiros para a sua seara. Mateus 9:37" (grifos meus).

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  2. Obrigado, nobre amigo! Veritas Vincit.

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